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DEUS AMA VOCÊ 10 (Lorimar Santos)

Rodovias em péssimo estado atrasam progresso do Brasil


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Brasil BR 163, As estradas do Brasil estão esburacadas, lentas e perigosas. Elas atrasam a nossa economia e tiram vidas. A repórter Sônia Bridi percorreu as principais rodovias do país, de Norte a Sul. É a série ‘Brasil: Quem paga é você’.

Não é fácil construir na Amazônia. Abrir caminho na selva, com pouco tempo sem chuva para trabalhar o chão. Mas demorar 40 anos e ainda ter a estrada incompleta.

O Fantástico foi ao Norte do Brasil. A BR-163 é uma espinha dorsal, passando pelo centro do país, do Pará até o Rio Grande do Sul.

De Santarém até a divisa com o Mato Grosso, são 980 quilômetros. Mas, 460 quilômetros ainda estão em estrada de chão.

José Roberto Pereira, caminhoneiro: É muito, muito chão.
Fantástico: Que velocidade o senhor pega aí no chão?
José Roberto Pereira: A velocidade é 5 por hora, 10 por hora.Leva tempo até o caminhão sumir de vista.

“Tem muito transtorno a viagem. Falar que é uma viagem maravilhosa não é. É uma viagem bem dificultosa”, diz José Roberto Pereira.

Difícil se você carrega 20 toneladas de soja.

“Na época que não chove, na seca, é muita poeira. E na chuva é muita água, muito barro”, conta Gregory Ferreira, caminhoneiro.

São 12 trechos de obra. Um está sendo tocado pelo Exército. Como o resto do percurso, intercala asfalto e terra. Falta pavimentar 40 quilômetros. Mas vai demorar.

“Esse ano, aproximadamente 20 quilômetros de asfalto. E no próximo ano, 20 quilômetros. Entregando essa estrada para essa população por volta do mês de dezembro de 2014”, afirma o coronel Sérgio Henrique Codelo, comandante do 8º BEC.

Na maior parte do ano, a chuva dá umas poucas tréguas. E quando volta, é de enxurrada.

Basta meia hora de chuva pra estrada ficar alagada. E essa água toda, além de provocar erosão e encher a estrada de buraco, faz do trabalho de construção na Amazônia um grande desafio.

Há pontes prontas, mas sem o aterro nas cabeceiras. Na última estação de seca os militares entregaram as mais urgentes, como a Ponte da Enxurrada.

Em um trecho de 112 quilômetros entre Itaituba e Rurópolis, no Pará, a BR-163 se funde com a Transamazônica. Essa estrada que foi aberta no começo dos anos 70 do século passado pelos militares e que, só agora, 40 anos depois, tem sinais de que o asfalto finalmente vai chegar.

O atraso vem de longe. Só em 2009, as obras foram reiniciadas. Mas a empreiteira responsável por este trecho faliu. Deixou as pontes novinhas. E o povo usando as de madeira. O Dnit refez a licitação e o asfaltamento começa este ano.

Em outros três trechos da BR-163, o Tribunal de Contas da União encontrou indícios de sobrepreço, superfaturamento e pagamento por serviços não executados.

O TCU aceitou a defesa de uma das empreiteiras. Para as outras duas, aponta potencial dano aos cofres públicos de R$ 31,4 milhões.

O Dnit exigiu das empresas garantias nesse valor, para não parar as obras até uma decisão final. Não pararam, mas atrasaram, como atrasa a viagem.

“É bastante risco, porque é liso. O caminhão perde estabilidade. Falar que você tem segurança é difícil. A segurança é bem pouquinha”, conta o caminhoneiro.

Caminhão não consegue subir. Tem que voltar para pegar embalo. Assim viaja a riqueza das lavouras mais eficientes do planeta. A estrada é importante porque reduz distâncias continentais.

Em vez de embarcados pelos portos do Sul, os grãos pela BR-163 chegam até o Porto de Santarém, de onde saem navios para China ou Europa.

Ainda mais barato: aproveitar o Rio Tapajós já desde Miritituba - 350 quilômetros antes de Santarém. De barcaça, a soja viajaria até Belém, para ser embarcada nos transoceânicos.

A Confederação Nacional da Indústria calculou que, com a estrada pronta, o agronegócio brasileiro economizaria R$ 1,4 bilhão por ano em frete. Ou seja, a obra se paga em pouco mais de um ano.

“Nós poderemos liberar os portos de Paranaguá, Santos, que são portos para manufatura. Os nossos custos serão melhores na medida em que eu desloque o produto da agricultura para o norte do país”, ressalta José Augusto Coelho Fernandes, diretor de Políticas e Estratégias da CNI.

E a previsão hoje é que o asfalto fique pronto no fim do ano que vem.

A BR-101 é a principal rodovia do país, que acompanha milhares de quilômetros do litoral.

Em Santa Catarina não só é o acesso de turistas para as belas praias. Escoa a produção gaúcha, e liga o Brasil ao Mercosul. A estrada é antiga, e sobrecarregada, mais do dobro da capacidade.

A duplicação começou em 2006, mas empreiteiras não deram conta da obra, que foi relicitada. Passados quatro anos do prazo da entrega, ainda faltam as obras mais caras.

A Federação das Indústrias de Santa Catarina calculou o prejuízo.

“Neste período de 2009 a 2012, deixaram de ser gerados na região cerca de R$ 33 bilhões”, afirma Glauco Côrte, presidente da Fiesc.

Há prejuízo impossível de contar.

“Mensurar uma vida, duas vidas, no meu caso, três vidas é muito difícil”, diz Emilson de Carvalho, comerciante.

Em frente ao posto de saúde que leva o nome da filha mais velha, o Fantástico encontrou Emílson de Carvalho. Dielly, médica, completaria neste dia 9 de junho, 29 anos. Ela morreu na BR-101, no mesmo acidente que matou a irmã, Gislayne, de 23 anos, dentista, e a sogra de Emílson. Só a mulher dele sobreviveu.

“A minha esposa continua ainda doente, ela não tem condição de voltar ao trabalho”, conta Emílson.

O acidente foi em outubro de 2010, quando a duplicação já deveria estar concluída. Mas a pista dupla voltava a ser simples, e tinha água acumulada no desvio.

“A gente está processando tanto a empresa quanto o governo federal por esse descaso que ocorre com obras do governo. Só quem está na situação, como nós familiares, como nossos amigos, como a comunidade onde elas trabalharam, sabe dessa perda, que é irreparável. Não tem dinheiro que pague”, explica Emílson.

Para terminar a duplicação faltam dois túneis. E a obra mais cara é a ponte da Laguna. O projeto foi polêmico: venceu o mais caro: R$ 642 milhões. Uma ponte estaiada, com jeito de cartão postal, que protege o ecossistema da lagoa e permite a passagem de barcos. Mas o TCU apontou sobrepreço de R$ 53 milhões, em custos de mão de obra e compra de areia.

O Dnit renegociou o preço da ponte, com redução de R$ 40 milhões. O general Fraxe, assumiu em 2011, depois que o antecessor foi demitido no processo conhecido como a faxina da presidente Dilma.

Fantástico: O senhor encontrou muito problema de gestão?
General Jorge Fraxe, diretor-geral do Dnit: O problema era de gestão. Não é problema técnico. Nós temos técnicos excelentes. Faltava gestão.

Um deles era a falta de programas de computador para engenharia.

“Sem isso aqui é uma grande aventura. É uma grande aventura, que não se sabe onde vai terminar”, diz o general.

Denúncias de desvio de dinheiro em obras derrubaram o então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, do PR. Assumiu Paulo Passos, que este ano foi substituído por outro integrante do PR, o ex-governador da Bahia, César Borges. Indicação de Alfredo Nascimento, o ministro demitido por suspeita de corrupção.

As estradas são o principal meio de transporte no Brasil, com quase 60% das cargas e 96% dos passageiros. Mas, no ranking de qualidade de estradas em 144 países, estamos na posição 123. E o problema não é falta de dinheiro.

Gil Castello Branco, consultor do Contas Abertas: O Orçamento é uma ficção. Nós vemos que a distorção entre aquilo que está previsto e aquilo que efetivamente é realizado é enorme.

“Hoje nós temos um bom problema. Qual é? O governo tem recursos para gastar, nós temos uma economia crescendo. E muitas vezes nós temos dificuldades pra gastar a execução orçamentária por falta de projetos que não foram feitos lá atrás”, afirma César Borges, ministro dos Transportes.

No ano passado, o ministério não conseguiu transformar em obras mais de R$ 6,5 bilhões. Só foram executados 62% do orçamento. A mesma média dos últimos dez anos.

O investimento em transportes no Brasil saltou de R$ 1,5 bilhão em 2002 para R$ 20 bilhões no ano passado. Mas ainda é muito pouco para dar conta do atraso.

O governo quer investir R$ 100 bilhões por ano, em seis anos. Para isso é preciso buscar recursos também na iniciativa privada. O Ipea alerta para contratos mal formulados.

“Nossa preocupação é que uma boa ideia, se ela não for bem elaborada, ela pode não ter um resultado adequado. Os erros cometidos agora se perpetuarão por 25, 30 anos que são os prazos desses contratos”, afirma Carlos Campos Neto, pesquisador do IPEA.

O Fantástico mostra o que acontece também na BR-101, em uma parte já duplicada e administrada por uma empresa privada. Onde cruza a área urbana da Grande Florianópolis, está o trecho mais perigoso em rodovias federais do Brasil. Nesses 47 quilômetros, em 16 meses 248 pessoas morreram em acidentes. Uma a cada dois dias.

Pra diminuir esses números vergonhosos, o governo fez um projeto: uma via de contorno da Grande Florianópolis, tirando esse tráfego pesado de dentro da área urbana. Essa obra foi incluída como contrapartida na concessão da empresa que explora os pontos de pedágio. Só que passado o prazo pra conclusão da obra, ela ainda nem começou.

Hoje, o contorno tiraria de lá o tráfego de 18 mil caminhões por dia. O projeto estava pronto: 47 quilômetros para ser construídos até 2012. E o custo dessa obra, entrou no cálculo do pedágio cobrado desde 2008.

“Hoje, a situação é a seguinte: não foi feito um metro da implantação deste contorno”, diz Ricardo Saporiti, conselheiro da Fiesc.

Não foi só atraso. A Autopistas Litoral tentou encurtar o contorno em 20 quilômetros, uma obra mais barata. A ANTT, a agência encarregada de garantir o cumprimento do contrato, aprovou a mudança e deu mais três anos de prazo para a entrega da obra. O TCU não aceitou.

“A análises feitas pelas áreas técnicas do Tribunal de Contas não deixaram qualquer dúvida de que o valor previsto no contrato de concessão era de 47,3 quilômetros”, afirma Marcos Bemquerer, ministro-substituto do TCU.

O Tribunal apura as responsabilidades da concessionária e também da Antt.

Fantástico: O projeto foi encaminhado muitos anos depois da data pro final da obra.
Viviane Esse, superintendente da ANTT: É exatamente.
Fantástico: O primeiro projeto que foi alterado também foi entregue com bastante atraso.
Viviane Esse: É. A apuração da responsabilidade pela concessionária por esses atrasos ela está em análise.

Fantástico: Houve uma demora de reação da ANTT?
Cesar Borges: Olha, a ANTT me disse que multou a empresa, mas as multas não foram suficientes. Não resolveram o problema.

As multas somam R$ 20 milhões.

Fantástico: Que tipo de punição pode haver?
César Borges: A rescisão do contrato.

Finalmente, este ano, a empresa foi forçada a voltar ao trajeto original. E só agora começa o processo de licenciamento no Ibama. As cidades cresceram e um conjunto habitacional do ‘Minha Casa, Minha Vida’ foi feito bem no meio do caminho. Um novo desvio encarece a obra.

Fantástico: E essa diferença de custo é repassada na tarifa do pedágio?
Paulo Pacheco, diretor técnico da Autopistas Litoral: Essa diferença de custo é analisada pela agência e avaliada.
Fantástico: E repassada à tarifa?
Paulo Pacheco: Se assim for decidido, sim.

Mas a concessionária já acumula lucro indevido, segundo o TCU, pelo pedágio pago sem que a obra fosse feita.

“Até agora quem está pagando o prejuízo são os usuários da rodovia. Eles tão pagando um valor de pedágio maior do que deveriam”, destaca o ministro-substituto do TCU, Marcos Bemquerer.

Pagando caro e sem saber até quando a rodovia da morte vai cortar suas cidades

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